quinta-feira, janeiro 30, 2020

A POESIA DE HANG FERRERO



D'AMOR

ela por inteiro
na minha boca,
pra boca minha.
nos caminhos dela
sou poro, piro
e transpiro a mim
na pele dela.
ela, goela abaixo
é bom, eu acho;
moldura da minha tela.
seu segredo, ora revela
mas, por baixo, prefiro
acreditar na poesia
de caso pensado
entre Deus e ela:
” vá Cupido, vá!
faça tudo, tudo!
do teu arco lança
e da tua flecha cela “

PHOBOS

soube da sombra
juntou-se parasita
criou desordem
quase renuncio
a este fragmentado
corpo-carapaça
soube do meu descuido
por sobrevida
abraçou minha alma
a outra parte
soube visitar do alto
um tipo plural
de relativa agonia
soube que era minha
eu soube ser uma parte
de três: dor, covardia e medo
duas porções crispadas
de indiscreta humilhação
mas soube ter uma parte
de alma, que tem urgência
e que grita porque arde
soube abraçar
a terceira parte
soube ser frágil
a parte que cuido agora
pra ser forte
desde que soube
a vida ressoa
não mais parte

PITADA

é sempre por entre os ecos que amo.
pouca luz, silêncio, sombras virtuosas.
é sempre a cúrcuma que me tempera.
sopro um balé anasalado e assanho
a dança do fogo; são segredos da vela.
aperto os olhos por uns três instantes,
abro-os feito espasmo, o mais rápido
que posso e tenho assim, raízes de sol.
por ser sempre amor, eu só troco o chão
por poesia e voo com quem ama.
crio chuva com o pólen das abelhas,
visto o amor da bonita roupa feita
pela velha aranha fiandeira,
que tece um mundo todo enquanto vive.
esta coisa que grita prosa em mim
e me lambuza de vida, parece querer
sempre exagerar em 50 anos luz
e mais duas porções para cair do prato.
é sempre por entre os ecos que amo.

QUADRADISMO

subverto quando penso
quando embarco n’outras geometrias
quando m’arrancam do quadrado
se me exponho quando explano
que estou fora quando supõem
que estou dentro de quando em vez
quando quase nunca concordo
quando quase sempre saio do quadrado
eu, ( pensam ) subverto ao cubo

LÁCTEA

pálida, branca
cálida
clara neblina
ávida
pálpebras na noite
gélida
encanta e entoa
válida
casta de crença
cética
posto por gosto
“lácteo”
o fanático
às quatro luas

PERMISSÃO POÉTICA

não faço do luto
o meu habitué
tenho preferências…
de excentricidades
danifiquei um quadro
de Monet
não tenho os zilhões
para o reparo
só minha cara lavada
de ménage à trois
e o copo de Baudelaire

FRONT

fura-se o fluxo
parco côncavo
ao avesso do convexo
acerta-se o prumo
enquanto desconverso
no contraponto reverso
de todo discurso sem nexo
sagra-se o contrassenso
não porque digo
mas porque peço
enquanto clamava ( bastava )
por um amplo amplexo
desculpas ao desfecho disléxico

POR FORA, COM A INTOLERÂNCIA
Primeira tentativa: Cordel

Ora vejam só; que ironia
pois me pego noite e dia
a refletir da importância
tendo que falar da intolerância

Por certo que incomoda tanta gente
mas de agora é assunto premente
posto que me é movimento
que se dá com encaminhamentos
e surte efeito no pós guerra da ganância

De gente que se acha importante
sobre toda e qualquer circunstância
que sequer respeita a infância
de quem nada quer com o ódio
e do desejo; só quer ser criança

Esta ausência de habilidade
de respeitar as condescendências
que alimenta o bucho da maldade
e mata de fome a consciência…

Segunda tentativa: esclarecimentos

Escrevo estas mal traçadas linhas e deixo
“às claras” a minha perturbação
em elucidar o meu ponto de vista,
então deixarei aqui, outra sugestão:

Terceira tentativa: fosso de jacarés

anotem aí os ingredientes:
6 jacarés famintos no fosso
mais ( + ) uma escadaria.
antes de subir os "lances",
se conseguir ( a intolerância );
passar pelo fosso e subir
alguns degraus, "a gente" aperta
um botãozinho e os degraus somem
e, a intolerância, cai de costas
novamente no fosso de jacarés.
se ainda insistir, puxando
pelo corrimão, saindo do fosso,
apertamos de novo o botão,
e uma pedra rolante enorme,
no estilo Indiana Jones,
desce as escadas, esmagando
a intolerância, lançando-a
de novo, no fosso de jacarés.

Como podem ver, não tenho paciência com a intolerância. Gosto mais de jacarés...

DESNUDO

roto de tão tosco
no rabisco sacro
de tão ocre
me fiz ogro
de tão ermo
meu espaço
que tão íntimo
me fiz efêmero
de tão louco
me fiz etéreo
santo como fora dito
diferente do que penso
no senso curto
como base manca
encruada laica
de querer do grito
atingido torto
e de acertos
improvisados quantos
do sujo sábio
de motivo escuso
e ao povo pranto
e nisso sofro
de perder o eixo
e se riem disso
me fazendo bicho

A FLECHA

não recorro
aos insights da tristeza
e a retiro do meu berço
esqueço e energizo
o ponto plantar
dos meus pés
com a leveza
sabe-se lá pra onde vai
minha consciência tétrica
em mim não fica
prefiro a amenidade tântrica
e a energia fugaz
feérica quântica

HANG FERRERO – O poeta e produtor cultural Hang Ferrero é autor dos livros Aos Pés do Monte Mor(poesia,  2013) e  Código 1 - Crônicas de Plantão (2016). É co-fundador e coordenador do Grupo de Escritores Verbo e Maresia (2014), apresentador do Festival 6 Continentes (o maior Festival de Artes Integradas de Língua Lusófona do Mundo - 2015, 2016, 2017, 2018 e 2019), fundador da Academia Mirim de Letras da ALBSC Seccional Itajaí/SC – 2017, membro Correspondente Internacional da Academia de Letras do Brasil/Suíça – 2018, membro Imortal da Academia de Letras de Balneário Camboriú – 2018, criador do projeto Casa de Ferrero, Espetos de Pau, que consiste em declamar poemas autorais com recursos do Spoken Word (poesia falada) e visuais, além da música conceitual (acompanhado por DJ). Veja mais aqui, aqui, aqui & aqui



domingo, janeiro 26, 2020

A ARTE MUSICAL DE BONNY BROWN EM ENTREVISTA TTTTT



LAM - Bonny, vamos para a pergunta de praxe. Como e quando se deu seu encontro com a música?

Aos meus 14 anos aproximadamente, costumava frequentar uma esquina, próxima da minha residência , no bairro do recife onde ali se reunia alguns rapazes com violões e flautas doce e eu achava muito bonito e prazeroso. Ao completar meus 15 anos, recebi do meu pai um violão (Gianini Trovador) e continuando a frequentar a mesma esquina fui aprendendo as primeiras notas.


LAM - Quais as influências da infância e adolescentes que foram preponderantes para definição de sua profissão pela música?

Observava com tamanha admiração o meu  pai a curtir belas músicas na voz de Nelson Gonçalves , Altemar Dutra ,Calbi Pexoto , Ivanildo sax de ouro entre outros.


LAM - Como e quando se deu a sua primeira apresentação pública?

No ginásio, costumava levar o violão para a escola e me reunia com alguns colegas para tocar e cantar. Certo dia a coordenadora me intimou a fazer uma apresentação no auditório do colégio no dia do estudante e me deu então uma das obras mais bonita interpretada por Milton Nascimento, Coração de estudante, a qual realizei todo trêmulo e tímido.


LAM - Você participou de diversas edições do Forromares. Conta pra gente como foi esta experiência?

A minha experiência ao participar de vários Forromares, além da emoção ,foi muito significativo , naquela fase eu dividia o palco com outro músico de uma bagagem imensa, principalmente na área cultural, o chamado hoje de Zé Linaldo (Linaldo Martins) onde aprendi muito mais na área musical cultural além de me familiarizar com mais um enorme público.


LAM - Em 2000 você lançou um cd acústico e ao vivo. Como foi a realização desse projeto?

Esse projeto foi realizado com muita dificuldade, por fatores financeiros mas ,com ajuda dos amigos empresários e músicos realizei a obra.

LAM - Em 2017 você lançou o cd Bonny Brown, fala pra gente acerca dessa realização.

Mais uma vez enfrentando as dificuldades financeiras, recebi o apoio de outro músico de Recife ,do bairro de Areias , o amigo citado tem um pequeno estúdio montado em sua garagem, facilitando assim a gravação, juntando os músicos que participaram desta obra, meu filho Paulo Raphael (percussão) e o contra-baixista (Marcelo Nunes) meu irmão.


LAM - Em 2019, você lançou o cd Interpretação. Como se deu essa experiência e qual a receptividade.

O disco Interpretação foi uma ideia de um amigo de recife que admirado com a forma e o timbre de cantar forró, me apresentou alguns playbacks do gênero junino e eu resolvi aplicar a voz em um pequeno estúdio em Palmares.


LAM - Você participou de gravações de diversos CDs de amigos, inclusive, o das parcerias de Zé Linaldo & Genesio Cavalcanti. Conta pra gente dessa festa com os amigos.

Recebi vários convites do compositor Zé Linaldo para gravações em seus pois naquela oportunidade trabalhávamos juntos dividindo o mesmo palco. Outros convites surgiram nos lançamentos dos livros do poeta Genésio Cavalcante anexados aos respectivos CDs, onde participei de algumas interpretações.


LAM - Como é cantar na noite e procurar desenvolver um trabalho de cantor nos tempos atuais? Faz uma avaliação da sua trajetória.

Não vejo dificuldades em cantar nas noites, meu trabalho como cantor ou interprete é bem aceito por onde passo, de forma modesta, digo que toda área artística enfrenta hoje, grande dificuldade no momento político que já vem se arrastando por vários anos. No nosso país, a cultura artística precisa de uma melhor atenção.


LAM - Quais os projetos você tem por perspectiva de realizar?

Anseio gravar um novo disco, desta vez com músicas inéditas e usando um melhor recurso, para que possa adquirir melhores qualidades em execução, sonoplastia e etc...


BONNY BROWN – É cantor e violonista que participa de eventos e realizações, possui vários discos gravados e é presença marcante na noite pernambucana. Veja mais aqui.



quinta-feira, janeiro 23, 2020

A POESIA DE AMANDA ARAÚJO



NA GARUPA, A SAUDADE

Aquela motocicleta branca
Estacionou na minha calçada
Parecia ter um torcicolo
Ou olhada para as flores do meu jardim

Porque fostes parar logo ali, motocicleta?
Poderia ter levado esta tua bagagem pro outro lado da cidade

Aquela motocicleta veio falar de saudade

Sinto lhe dizer, querida motocicleta
Mas seu farol já apagou.
Não adianta mover nenhuma embreagem.

ONDAS DE TAROT

O latente dos olhos ciganos
Já pincelava o futuro
Arcaico era
Lapidando efêmeros luares
Reféns do Canoeiro
Cati, o chamavam
A ecoar o mar cristal
Da esmeralda que beirava o litoral sul.
Nu, naval.

RETIFICAÇÃO

Cumprir o protocolo
Bom seria um pouquinho
De lá, adormecida as erratas
Retificando a notícia
O mundo é lapidado a regras
Quebradas
Na tentativa de conserto
Falha fortemente.
O erro se constrói na destruição
De uma vida mansa
Sem previsões de escrúpulos
Avistando um crepúsculo
Que antecede o luar.

DESTE LADO, SÓ O PÓ

Vi cumprir, mas só o pó
Que destilava o vento atroz
Aprazível para longanimos toques suaves

Ouvi soar o suor
Era barulho de cartas jogadas
Levemente adocicadas e ásperas

Senti o paladar salivando
Loucura desenhada a lápis
Ruptura que encarnava o elo.

Saboreei a existência de uma foto
Estática, falava de Vênus
O mais belo que emanou luz.


DOR EM SÃ

O impulso de sê-lo
A punição da trilogia em glândulas
As sebáceas de salivar
O tinto da linha tênue
Com parabrisa desesperado
Entre ventos torrenciais
De praxe, baixa umidade
Para o magnífico de uma destruição iminente.
Era estatística pressentida
Você me adoecia.

TRIANGULO ALITEROSO

Leve e lave
Lê o louvor
Loucura a lápis
Labor de uma vida insana.

Fale o feito
Fazendo florescer
Flamingos a flutuar
Faltando apenas a desventura.

Cante o calor
Clareador de conserto
Comemorando com confetes
Calmamente personificando o fôlego.

Rios raivosos
Respeita as redondezas
Responde com rapidez
Resolvi a vida por caminhos hostis.

INTEMPERANTE

Pálida e feroz
Correndo a noite inteira de prazer
Vagando nos vagalumes
Iluminando a voz do amanhecer

Encontrava-se destemida
Pronta para o ataque
Soltou as pétalas ao vento
Apontou para o almanaque

Era apenas uma criança
Acompanhando a solitude
Seus traços alvos
A indagava por amplitude

Ó, doce menina
Preserve a sua ingenuidade
Amanhã, talvez
Cantará sobre os lírios
Além da sobriedade.


AMANDA ARAÚJO - Poemas da poeta e crítica literária Amanda Araújo, acadêmica de Letras pela UFPE (EaD), incluída nas antologias O futuro da poesia (2017) e Dezditos – Poemas Selecionados (2018), organizadas pelo poeta e professor Admmauro Gommes. Veja mais aqui. 



segunda-feira, janeiro 20, 2020

POEMAS & TEXTO DE TONY ANTUNES


EXORTAÇÃO AO POEMA

Ergue-te poema!

Grita, trágico alárico
soa nos surdos orvalhos dos olhos
das manhãs
mescla tardes, mutanteia as noites.

Engole o tempo e o espaço
concreta tua tez
ensolara a sombra que de devora nua.

Abre-te aos corações fechados
singulariza-te nos plurais
das intenções.

Petrifica-te nas almas repletas
de vazios.

Mergulha no mármore das minhas paixões
espatifa-te livre no amargo véu embrionário
das minha doces ilusões.

Eleva-te ao expoente máximo da tua brevidade

Dessa forma, no transverso do avesso
suprimo lírico esta voz.

Reluzo-me ao pó, num rasgo de risco
e sem data cravo meus dentes nos
obtusos óbitos
da própria morte.

TRAÇO FLUTUANTE

As crastinas do credo em cruz
fosforesceantes de agonia em rezas carmins
lapam as lágrimas de granizo e pó.

Flâmbulos de quirodáctilos em ristes
riem descaricaturados de febris ânilos.

Os nastigados sopros agoníacos
resboreados de verticalidades loram
lipidiosamente

Flutuantes, flebulares e fleumáticos
engasgagueiam-se gargarinos, nucléicos
e sorolados.

Em seus traços rebuscam fôlegos
nebulizados ciscam ao sabor dos sopros
depois, afogam-se copiosos e xerocados
em folhas de mar-fins.

CANALHISMO DE UM CADÁVER

Ao seco orvalho dos cristalinos percalços
crânulos de pus pulsam em pedregulhos
mórbidos, traiçoeiros e ladipantes em
negritos.

As moscas mascam em derredor dos dedos
alarindo a fé que não transcende aos tempos:
— Matam sonhos em pesadelos felizes.

Findados no começo do término, encovam-se
num limbrionário mostram-se ocos:
— Há um cadáver canalha atolado na
própria lama da agonia.

EMBRIONÁRIOS LÍNFRICOS

Frondados em frontes de cera
coloridos colorem a escuridão da
melancolia.

Grunhando-se em overdoses de azias
à margem das estradas se perderam
gangonados em afoinos de chibatas.

O misto de gozo e agonia – zimbra-se
cutículas vãs em contos de fadas
com bombas de escorpentinas.

Os dentes beijando as almas
lambem os espíritos embrionários
a escorrerem dos astros em bússolas
de solidão.

ORA, DIREI?

O que direi das lágrimas
do rouxinol que canta em meu peito?
Das dores dos faróis monocromáticos...

Do asfalto indiferente
às  causas dos pés que lhe pisam?
Das náuseas atônitas, tontas, mas não tantas...
o que direi?

O Que direi  das lástimas nicrolítricas – de fel?
Das amarguras silenciosas em cetins de
papel machê...

Dos gomos de plásticos – lásticos?
Dos câmbulos  da África estuprada...
o que direi?

O que direi dos almas sebosas?
Do acalanto cadavérico no cadafalso dos homens...

Da massa atômica do neônio?
Do isótopo num divórcio celular...
o que direi?

Ora, direi!


PROVARÍNEOS DE FULGORES

Fristigados de fórmulas flácidas
nêurons tortuosos simbronam-se
em números inexatos
— Não há dúvidas.

Os nítigos negam a própria sorte
furambulária de gota e de agonia.

Perícono osteanais de brin
terganalmente opulenta seu resultado:
— Um zero.

O tecido matemático, filosófico
biológico e químico
dispersam-se num atroz
sentimento perdido, prostrado e louco.

CRASSO POEMA CRASSO

Este belo poema feio
segura-se no slackline das nossas
retinas
perambula rumo ao acaso
queda-se livremente e nu ─ Torturado.

Reverberado e aturdido ─ Clama por um clárido.
profano e retilíneo ─ Chorora por seus algozes.

Com pedras de cetins monta sua decadência
a estourar nos corações sem ventrículos.

Resminguado e ronronado remoe suas
lembranças...

Seu jardim está vazio numa lápide de marfim
que reluz ante a calvidez do seu cérebro
ogrozado de esperança e languidez.

RAMALHETES DA MALDADE

Nos uivos opacos das neblinas
orvalham-se loucos atrevados
nas artérias solitárias.

A ruindade amargura, agrura
entremeia a alma dos espíritos
enfeia as fileiras das esperanças
suga átomos, neutraliza nêutrons.

Ríspidos eructantes em flatulência
se estouram
estorvados de pecados apenam-se
o burburinho combalido tomba.
— A idade desveste a fantasia.

O bóctio, no ócio da bondade
sismizifica-se nos olhos do fura(cão).

ORÁCULOS DAS INCIDÊNIAS

Os signos songis nas ruas
as superstições do sincretismo
com os orixás a banharem-se na lua cheia

Nas encruzilhas perpendiculares
os atabaques a soarem no ritual
perplexas mentes a se assombrarem

Perpetua-se um sacrifício
em meio às densas trevas
numa noite nua e sangrenta
A purular-se com velhas velas

E num pardo ebó de axé
um curumim em açã
a maniçoba devora.

UTEROIDE TUBA

Do Cosmo nítigos surgem vidas
Paralelas
em massa, todos esperançam
esperançados n’águas de concretos
fustigam as forças dos astros
e nolam afinidades afins

Placentários em uteroides tubas
todos passam pelo portal
vagináticos da vida

O oráculo destina o credo
hipnóticos humanoides se matam
— Não há justiça na matança cristã

No final, retingados de dores
somos almas penduradas nos
varais
presos pelos calcanhares
esticados numa rasa-cova
novo portal da vida.

LORINÁRIOS DE PERCALÇOS

A letra na palma da minha mão
marca o “status quo” deste poema.

Talhando a madrugada na tábua
deste papel
reflito os brásculos de uma poesia.

As baionetas das vírgulas pausam
meus pensamentos
ipublinados num pulso de poros
ar-dentes de suores.

Gulo-me de afoitezas atrozes
em lapsos de ternuras infelizes
calos em clãs de adagas malditas
abençoam e assoviam as chuvas dos
gritos aos ventos
no silêncio das madrugadas
surdas e mórbidas.

817B / L2 8º Andar

Pregado neste leito calcifico meu cérebro
o retardado tempo me aflige
as horas preguiçosas arrastam-se
os gritos das buzinas escorrem desconexos
e a brisa tapeia em carícias as dores ociosas.

O alarido da emergência e suturas
atroz se perpetua na memória
o éter e a ética supuram insanos.

Nafitídios gósmicos reluzem-se em pirilampos
de confetes
Sondas penianas penetram felizes os ureteres
ar-dentes
Em náuseas, propelindo lindamente, as urinas
escorrem
os ruins rins pagam por suas insanidades
os 184 degraus do térreo ao 8º andar
riem largos sorrisos de mangação em
conta-gotas
e as vidas cessam em choros agourentos
de dores, agonia e de tormentos.


DIVINA COMÉDIA DE UMA EMERGÊNCIA HOSPITALAR

Chegamos às 17h30min na ala da Emergência Clínica do Hospital da Restauração, Recife – Pernambuco, onde já havia um amontoado de gentes, mas que pareciam molambos espalhados pelos corredores.
Um forte cheiro de dor, gemidos e sussurros impregnando as paredes, o chão e teto, iluminados por umas luzes amareladas. Essa visão nos deu a impressão de estarmos entrando num matadouro público municipal.
Enfermeiros com seus ares de náuseas atendendo às necessidades dos desprovidos de saúde, moribundos, esquálidos e fatídicos a ampliaram essa visão, tal qual ”Guernica” de Picasso.
Cadavéricos CPFs com seus números e histórias de vida (agora de morte) na iminência de serem cancelados por obtusos óbitos a engordarem as panças dos urubus, donos de funerárias.
Doentes, atropelados e agonizantes esperam, ávidos em delírios, algum gole de esperança, nem que seja nos vômitos da caridade alheia. Uns purulam dolentes as cicatrizes dos cortes de peixeira, foice, faca e facão.
E nesta sutúrica comédia Dantesca, inferno purgatório e paraíso não passam de estatísticas no livro da politicagem assassina, corrupta, holocáustica e miserável.


TONY ANTUNES – É como é identificado poeticartisticamente o poeta, cronista, radialista, blogueiro e professor Gleidistone Antunes, que é graduado em Letras e pós-graduado em Língua Portuguesa pela Facauldade de Formação de Professores da Mata Sul (FAMASUL). Ele é formado em Radialismo pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), eletrotécnico pelo Senai e membro do movimento literário da Poesia Absoluta. Ele edita os blogs Poemas & Prosas e o Professor Gleidistone. Veja mais dele aqui, aqui & aqui.