Confissões (de mim e dos
outros)
Ou do cabide da memória
Onde dependuro meu ego
vão
Ou ideias brotadas
utilmente
Da bacia do inconsciente
(desbordada)
Tina que aduba de água
cônica
Messe líquida
Horta do outro em mim
Para que frutos não se
compadeçam
Da insignificância
Do meu ego portátil
Inviril, alcochoado
De ilusão estéril
Como um não...
Ou o sal. Como um cão.
PRIMEIRAS CONFISSÕES
Ébrios deuses aportam do
meu rosto volúvel
Começam ruidosa empresa
De acordar rios e veias
Fluindo de mim.
Adio sílaba pressaga,
unto
De argumentos macios
ferida
Que palavra abra no
poema
(porque poesia é a
palavra enlouquecida
E a loucura verbal não
cessa
Com morte transitória do
poeta).
Quilha da insânia aponta
Para mar do amanhecer
impuro
Água sóbria não a
governa
Apenas desancora
Do cais da jugular da
página
(do poema Desâncora
viva)
REIVINDICAÇÕES PARA
MORRER
Estradas da vida são
escuras
Estreitas sendas do ar
ermo da alma
Caminhos são de abrolhos
sólidos
E hóstias compulsivas
destoam
De cada passo passageiro
que doas
A quem morra na hora
antes de ti
Mapas foram apagados
Com pegadas dos deuses
ardendo
Gesto não é potável
Geografia está morrendo
Coração queimado
Como círio abandonado no
escuro
De um átrio sacrílego
Os domingos soçobram no
ambíguo
A TONA DA VERDADE
(A um trago de single
single malte)
Do copo de uísque a meio
(duelo de água e malte)
florescem cravos
E rosas sem ânimo,
flores estéreis
Do iluminado cálice dos
seus lábios pálidos
(que silêncio habita de
parede e treva).
Como sal e arruinado sol
Estou escuro em meio
À brancura ímpia do
abandono.
Viola estiolada, urge
derramando-se
Da boca dos incêndios sou
eu
Ouro carnívoro devorado
Como hóstia de mentiras
(e falsos desvelos)
A beira da verdade é
escura, seu fundo sem fim.
VOLÚPIA LÍQUIDA
De um bunquer poético
Da praça culinária do
Skyllos
No texto de operações
saborosas (teatro de saliva)
Do Shopping Center
Recife
Cercado de taças de
amendoim
E certeiros nacos de
filés
Cortejados por batatas
esplêndidas
Atiro súbito tragos de
single single malte
Acerto a própria boca trêmula
Sinto vibrar a alma
Com o prazer do corpo.
TESTEMUNHOS SEM VENTRE
(OU PERDÃO)
O homem é um poente vivo
Noturno orvalho o
ilumina
Sua pátina e pranto de
pedra.
Sobrevêm dores, trevas o
consolam
Com sais insurrectos ou
desnudos
Como pátria escura do
corpo traída.
Rios de sede morrem
A cada noite árida da
alma
A cada instante último
Do íntimo convulso.
O que drena a sede
O que dura a sede
Voragem decide.
ÚLTIMAS CONFISSÕES
(ESTE POEMA PROPÕE OU
SUGERE QUE CADA FORMA CONTENHA UMA ALMA)
Luzes se alvoroçam
contra céus escampos
Ângulos de vidro e
transparentes épuras
Submetem o espírito à
tortura lúcida.
Céus épicos são
convertidos em orações de pedra
A escatologia da luz
oferece-se aos olhos
Como prêmio escuro.
A geometria da
transparência
Seu atravessado prisma, imagens
de deidade
Sua luz vidrada
afugentam sombras inadiáveis.
Ave cristal cruza
Ermas estepes do espaço
Em orações de minucioso
quartzo.
Dos seus olhos pulsam
lumes de aço
(com cedilha e cansaço).
Translúcidas geometrias,
ângulos de cristal impoluto
E achas de luz não
fétida
Comandam a vida escura
da terra
(do homem inútil de
Deus).
(Geometrias de sombra o
Criador
Exponencial, triédrico
espalhou
No olho do homem como
papoulas no campo).
(Sonha-se por uma luz
higiênica – e diva
Que lave
Os olhos e não os cegue
mais).
INSONETO DE 2012 (NOV)
Inscrições se precipitam
Do rosto das runas
hínicas.
Venho de outros tempos
do verbo
Para a pátina do
presente insubmisso.
Meço volumes de ser
E ângulos de sede. Com varas
de água.
Faço pássaros
De voo indecifrável.
Caixas de música
infinita
Doo ao tímpano de
ovelhas bíblicas.
Conjugo o verbo futuro
Em busca da palavra por
vir.
O infinito estar vazio
É próprio de mim.
E assim feche esse sonho
de soneto.
TRISCONFISSÕES
Fiz amor nos bordeis de
Maceió.
Deixei translucidas
manchas do sêmen vital
Nos lençóis dos sábados perto
da Praça do Bar alagoado
E nacos de carne amada
Na tábua de sal gemendo
depois da lua.
(Marca dos gozos nos
colchões ainda geme).
HOMOCOITO (CONFISSÃO
ROXA)
Por um triz
Homorrelação não fiz
(e rimou).
E por dois trizes
reticências.
Fiz sexo com a mãe de
Édipo
Ontem.
CONFISSÃO NUA
Sinto-me causada por
elementos sem corpo
Por vésperas de feitos
ressuscitados
Por hinos de outono, por
falhas de acanto
Alento foi-me fuzilado
como uma bofetada
Dos pulmões ávidos de
espaço e fluxo, ar
De que devoto e sôfrego
fogo necessita
Para fender a pedra,
chama líquida
Odre empedernido, caixa
de pássaros, lume
Varre a terra, desola a
alma, fuga infinita
Falo da palavra, hímen do
poema escavo
Sombra de mostarda, fuga
para o éden renato busco.
CONFISSÕES – O livro Confissões
(Autor, 2012), do escritor, jornalista, advogado, professor,
conferencista e tradutor Vital Corrêa de
Araújo, traz Nota & Confissões de Vital
Corrêa de Araújo por ele mesmo, Prefácio de Cláudio Veras com A poesia de Vital
Corrêa de Araújo, Desvalor poético (ou a forma desprovida da ratio artística
por Vital Corrêa de Araújo & (Meu poema é para os não habituados. Para os
habituados não é poema) & Apresentação de Murilo Gun. Veja
mais aqui, aqui,
aqui,
aqui, aqui e aqui.