TCHELLO D´BARROS – Tive a oportunidade de ter o primeiro contato com a arte de Tchello
D´Barros pela internet no final dos anos 1990. A partir disso, participamos de
fóruns e grupos de poesia, trocamos muitos mails e batemos o centro na amizade.
Nos anos 2000 ele passou em temporada por Alagoas, ocasião em que emendamos os
bigodes, tomamos cervejas e cervejas, conversamos, participamos de eventos,
andamos pelo meio do mundo, fizemos artes & desartes, debatemos, dividimos
anseios e realizações, enfim, fui um agraciado pela vida de ter experienciado
uma das melhores amizades que pude construir na vida. Por causa disso, nada
melhor que reunir aqui um pouco dessa convivência. A primeira delas meritória
de destaque, foi a entrevista que ele me concedeu por Guia de Poesia e que aqui reproduzo. Em seguida, links de suas
atividades em Alagoas por ocasião de sua estada por Mazceió.
ENTREVISTA
- Tchello d´Barros é poeta,
escritor, artista plástico e ator catarinense, que começou a vida sendo
premiado com desenhos, até realizar exposições no Brasil e no exterior,
participa de antologias poéticas, publica livros, atua no teatro e milita nos
mais diversos eventos culturais e artísticos, a exemplo de chegar a presidir a
Sociedade Escritores de Blumenau. Mesmo com a sua vida intensa de trabalho e
realizações, visitando Maceió, eis que nos encontramos numa tarde de fevereiro
e conversamos despojadamente sobre seu trabalho, arte e vida. Com vocês,
Tchello d´Barros.
LAM: Tchello, parece que tudo começou com a
sua vida artística nas artes plásticas. Quando a poesia chegou até você?
Tchello
d'Barros : Creio que tudo começou mesmo foi com um tal Big-Bang! Bem
depois, em meu caso, por pura necessidade - estética e metafísica - de
expressão, houve uma identificação inicial com o desenho, ofício que amadureceu
na lida com as artes plásticas e artes visuais em geral. Participei de
exposições e salões de pintura, também ilustrei jornais, livros e
revistas. Mais tarde passei a fazer teatro, atividade que exigiu
muita leitura, incluindo-se aí a poesia, modalidade que nunca gostei. Ao
conhecer poetas de linguagem contemporânea e experimental - que não se vê em
salas de aula - passei a rascunhar uns versitos, já com meus 25 anos de idade e
talvez por acaso nunca mais parei. Em suma, a poesia chegou sorrateiramaente,
calada, alada, na calada da noite, como a lua, quando a gente vê, já está
lá.
LAM: Salvo engano você começa com os volumes
"Olho Nu" e "Palavrório". Como você vê sua trajetória a
partir desses lançamentos até o mais recente "Amor à Flor da Pele"?
Tchello
d'Barros : O lançamento desses livros foram a tentativa - vã - de organizar o
caos pessoal de um iniciante na arte poética. Uma proposta de reunir em
coletâneas determinadas propostas estéticas. "Olho Nu" é meu segundo
trabalho escrito, embora tenha sido lançado primeiro. É um livro de ideogramas
ocidentais, ou seja, resulta de uma pesquisa de linguagem, donde se teoriza
que o homem principiou a fala por onomatopéias e grunhidos monossilábicos.
Daí para a poesia foi um grito. Desconheço trabalho paralelo em nosso idioma.
Depois lancei "Palavrório", a primeira série de poemas que escrevi.
São textos que tem entre si uma organização rítmica e preocupação com a
métrica. A metalinguagem é outro elemento presente nessa série. Quanto à
temática os textos apresentam percepções sobre muito do que transita
entre dois polos da natureza humana: a sexualidade e a
espiritualidade. Esses temas e conceitos até hoje permeiam minha
produção em poesia. "Amor à Flor da Pele" surgiu bem depois,
depois de meus livros de hai-kais. São quadrinhas - trovas - e foi publicado
com uma versão em braille .
LAM: Você transita por várias áreas: artes
plásticas, teatro, infantil, literatura, dentre outras. Como você concilia tudo
isso?
Tchello
d'Barros : Penso - e sinto - que as coisas se complementam. Minha principal
preocupação não está na quantidade das modalidades artísticas que pratico, mas
na identidade de meu trabalho. Há que se manter o estilo e a linguagem
peculiar, em todas as criações, sejam visuais, sejam literárias. Hoje, mais
maduro, separo tudo por projetos, para que haja um mínimo de controle. Enfim,
são viagens diferentes, mas o destino, é o mesmo.
LAM: As artes plásticas exercem influência no
seu trabalho poético?
Tchello
d'Barros : Eu até gostaria de dizer que não, mas é difícil dissociar uma da
outra. Consideremos que na leitura de um poema, antes de se atingir o nível
semântico, estamos diante de uma imagem, uma mancha gráfica composta de
pequenas figuras, sinais, signos - as letras, palavras, versos,
estrofes - daí muitas vezes a oportunidade de organizar no espaço da página
tais elementos gráficos, com o propósito de atingir um equilíbrio no nível
visual. O poema por vezes é diagramado no espaço, mediante recursos das artes
plásticas. Como vingança, eventualmente o próprio poema se utiliza do tema da
pintura.
LAM: Com o livro "Letramorfose"
você reúne poemínimos. Fala um pouco dessa sua proposta poética.
Tchello
d'Barros : Creio que "Letramorfose" define e fundamenta o trabalho
iniciado em "Palavrório". São 50 textos curtos - três anos de
elaboração - explorando as possibilidades semânticas, fonéticas e visuais que
as palavras permitem. Há aí desde neologismos até trocadilhos, de expressões
populares até gírias e regionalismos. Mas tudo filtrado sob a lente da
metalinguagem e o prisma da concisão. É tudo enxuto e exíguo, lapidado mesmo.
Se tirar uma palavra que seja, o poema desmonta. Essa obra exigiu uma seqüência
- mais 50 poemas, mais 3 anos - que se traduz no livro "Vide-Verso",
já apresentado em versão virtual, inédito em versão impressa. Como essa série
de poemas exige o mínimo de palavras para comunicar, as pessoas começaram a
chamá-los de poemínimos .
LAM: Você desenvolve um trabalho de
militância literária em Blumenau. Fala prá gente como se dá essa experiência,
da forma como é desenvolvida e o que você traz dessa experiência nesse
trabalho?
Tchello
d'Barros : São mais de 10 anos de política cultural em várias cidades do sul do
Brasil. Antes vou mencionar que minha obra não é engajada, talvez engajada seja
minha atitude diante do sistema. Não sou filiado em partidos, mas minha atitude
é política. Participei de entidades e associações de artistas, com o objetivo
de conseguir mais espaço, recursos e mesmo reconhecimento aos que fazem arte
mas vivem a mercê do sistema capitalista e de uma sociedade consumista. São
experiências positivas, com conquistas reais, seja brigando com políticos
alienados, provocando empresários avarentos, cutucando a burguesia alienada,
refutando pseudo-críticos ou afrontando os mercenários de plantão. É preciso
lembrar que a arte no Brasil é riquíssima, mas a cultura - a indústria cultural
e seus meandros - são uma balbúrdia completa, um descalabro total. Não vou
destilar aqui relatório de atividades, pra não cansar os leitores mas finalizo
mencionando que quanto mais a classe artística conseguir força mediante união e
conhecer seus direitos, maiores as chances de mudar esse quadro que se agrava
com o fenômeno da globalização.
LAM: Você já presidiu a Sociedade Escritores
de Blumenau. Fala um pouco a respeito disso.
Tchello
d'Barros: Fui co-fundador da SEB e presidente por duas gestões dessa entidade
literária que hoje conta com escritores de vários estados do Brasil e mesmo de
outros países. A entidade surgiu em função do descaso com que os escritores são
tratados e de lá pra cá foram muitas conquistas, desde o intercâmbio cultural
entre autores e entidades, participações em Bienais do Livro - Rio e
Sampa - Feiras, Congressos, Eventos, Lançamentos, Antologias, Projetos,
Patrocínios, Prêmios, Cursos, Concursos e uma série de ações culturais que não
seriam possíveis sem uma entidade desse porte. A SEB apresentou para a
prefeitura da cidade de Blumenau o ante-projeto de um congresso literário de âmbito
nacional e a Fundação Cultural de Blumenau, em parceria com a SEB, realiza esse
evento com o nome de Fórum Brasileiro de Literatura. Já participaram nesse
projeto nomes de relevo da literatura nacional e nesse momento está em fase de
planejamento a terceira edição desse evento que é um significativo momento de
discussão entre autores, editores, livreiros, tradutores, ilustradores,
professores e amantes da literatura em geral.
LAM: A gente teve oportunidade de conversar
bebemorando muito a respeito de vários assuntos. Gostaria, portanto, que agora
você fizesse uma análise de como você vê a poesia e a literatura em geral
atualmente?
Tchello
d'Barros : Confetes à parte, considero um privilégio dialogar com um autor
- e editor - consciente e erudito do naipe de um Luiz Alberto Machado. Penso
que no Brasil alguns caminhos se desenham no horizonte da literatura. O
brasileiro está lendo mais - inclui-se aí a egrégora internauta - está
tomando conhecimento da nova e novíssima geração de escritores. A indústria
gráfica/editorial está caminhando para a excelência - tanto em forma
quanto em conteúdo - e as Bienais do Livro nunca foram tão visitadas. A cultura
popular - digamos aqui o cordel e tantas outras formas fixas de
nosso rico Brasil - estão resistindo e se afirmando diante da globalização e
americanização de nossa cultura e idioma. Em contra-ponto, creio que ainda
falta muita discussão no meio intelectual e crivo por parte das editoras. A
mídia fica devendo pela falta de crítica - e resenhas - e as universidades
pela pouca valorização da literatura de suas respectivas regiões. À parte
isso penso que estamos todos inseridos num interminável lance de dados.
GP: Fala prá gente os projetos que você têm
em mente por realizar.
Tchello d'Barros : Quem me conhece
pessoalmente sabe que raramente comento meus projetos. As pessoas ficam sabendo
quando recebem o convite ou lêem na mídia, depois que está tudo pronto. Aqui
vou adiantar apenas que estou aí as voltas com meu livro de relatos de viagens
pelos países onde perambulei e nas artes visuais estou catalogando antigos
trabalhos e pesquisando uma série de Mandalas e Labirintos, assuntos pelos
quais sou apaixonado e estarão presentes em minhas próximas exposições. À
parte isso, meu principal projeto é mergulhar cada vez mais fundo na vida, com
sua multiplicidade de experiências e aventuras.
Entrevista originalmente publicada no Guia de Poesia do Projeto SobreSites.
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