NOTÍCIA
DO TÍTULO E CAPA
Sobre coleção
de poesias “Kant não
Estuprou
a camareira (foi firula de Lampe)
E Ler
VCA causa AVC
Este (sub)título
tem por alvo desfazer quaisquer
dúvidas que
pairassem por ventura
quanto à
honra (perpétua como a paz) e integridade
solar de
Immanuel Kant, meu filósofo
de
bolso, em relação ao fato (aleivoso) dele ter
estuprado
a camareira.
A bem da
boa verdade (apodítica inclusive): Kant
nunca estuprou uma camareira sequer. Na sua
venerável
residência em Konishberg (hoje, cidade russa).
Tal
calúnia não teve autoria real estabelecida.
Atribuem-se
a Lampe, seu fiel mordomo por cerca
de cinquenta
anos.
Seria lorota,
firula, parola a cruel autoria?
Não de
um Lampe revoltado por ter sido despedido.
O serviçal
kantiano, seu camareiro, confidente,
enfermeiro,
devotado cozinheiro do exigente e
enjoado Kant
para se alimentar, filosoficamente
ingerir
os carboidratos apropriados a fazer funcionar
mente
tão desmesurada, e acompanhante íntimo
(isto é,
da intimidade de um mordomo) por
cinco décadas,
estaria despeitado – e colérico,
pelo fato
injusto de Kant tê-lo dispensado,
sem nem
ao menos aviso-prévio (que
não
existia à épca) sem mais nem menos?
Colocado
abrupto, de inopino, ao pelo da rua,
Lampe
foi de armas e bagagem morrer
num asilo
de esmoleu.
Portanto,
no olho da rua, de uma hora para outra (sem
prévio
aviso ou proteção mínima) viu-se em sarilhos,
não viu
solução para sua vida, se não recolher seus ossos
a um
asilo público. (Ia dizendo púbico).
Na época
(sem Getúlio Vargas konisgberguiano) não
havia direitos
trabalhistas, fundo de garantia, carteira
assinada,
essas coisas; não se acreditava em
previdência
(e a Providência era indiferente). E
Lampe
saiu leso e liso, lesado direito
para um
asilo solitário.
Faço questão
de estampar o desmentido no
título
desta coletânea para que não sobrassem
dúvidas
acerca da integridade moral e sexual de Kant.
E na
capa soasse: Kant não estuprou a camareira.
(Isso
pode ser coisa de Lampe)
A capa é
um magnifico poema visual de
Silvio
Hansen, criação visual concebida com a maestria e argúcia
gráficas
de Marcus ASBarr;
SH
consciente do cabalismo hermético hieroglífico
e enigmático
de minha poesia pé-cabeça bolou
o genial
e bem (ou mal) intencionado aforismo:
Ler VCA
causa AVC.
CONFISSÃO
(SINCERA) DO POETA
Sob postes
de octaédricas luzes
E sombras
circulares estaciono
Com a
cadeia de lado, coleira ávida em riste
A ouvir
vasos angulares uivarem
E crivos
pitagóricos inúmeros
(como
coisas kantianas) bradarem
Das veias
de Sócrates que cicuta acatam
Religiosamente.
VEIO DE
DEUS
Do embate
de catracas primitivas com sílabas
Da forja
do tempo com infinito comungados
Em coito
incontrolável
Da empedernida
cópula do espaço e da eternidade
Da boda
do que não cessa com o que não acaba
Veio Deus.
PALAVRA
NAVEGA
NO MAR
PICADO DO POEMA
A palavra
naus singra seios
Entre claustros
frios lua pasta
Silêncio
rural
Tormentosas
ondas gritam
Da garganta
encrespada do mar
De abril
abdominável.
A palavra
navega ancora na página.
(O poema
brota da palavra nau
Encapelada
de sílabas
Enquanto
as vozes do cais
Demoram
como pássaros intrincados).
SOMBRA
DO BARRO
(a morte
também é de barro)
O que
sobra do barro sombra leva
Em inefável
caravana por senda escura.
Voa para
além da tênue sepultura
Sopro que
ao morto abandona
E feito
pássaro assoma a cimos lentos
Que a
noite modela com veloz minúcia.
Vai-se o
rosto no vórtice supremo
E no
mármor eterno deixa apenas
Traços furtivos
de aroma tão raro
Que a
memória preserva com usura.
Até que
incerto rumor corrompa
As puras
vozes da espera
E na
argila que reste treva esculpa
As frias
legendas de sua injúria.
(O
FUTURO NÃO VIRÁ: EIS A SENTENÇA)
Profeta plúmbeo
me ordeno
Pedra proferindo
escuro
Grito encarcerado
Na garganta
do futuro
Deserto perora
Orações de
areia vento cria
Nada o
que seja humano
Ao poeta
será estranho
(para
que ele me empobreça com honra
E não o
estranhe tempo vivo)
Humano é
o que industrial seja
Comercio,
perda, ganho
Corpo,
alma
Tudo é
humano
Menos o
poema.
(DAS
ASAS FRIAS DAS GUITARRAS)
A sonata
das folhas finda
(quando
a queda termina
Os alados
trompetes adormecem)
A orquestra
recolhe
Os
delicados instrumentos
Que
amealham a alma
Frio rumor
invade a cena
A umidade
abre as asas
E tudo pluvial
Clarinete
de capricórnio ecoa
Os idos
de março preparam
Acordes de
água (e líquidos bemóis
Em forma
de abruptos albatrozes)
Quando vem
a inundação consoladora das guitarras.
POMAR DE
FRÁGUAS
O tédio
de tudo criar-se de onde havia somente
Fúria de
saber-se absoluto, uno e morto
Semente
sem ventre, cansaço, vago, úmido
Havia somente
vasta incerteza, expectativas nuas
Além do
som que o pranto do tempo (incriado também)
À terra
prometia, música de sal, tambor vital
Urro cósmico
presa da garganta de Deus
(como
fráguas inacessíveis e férreas
Brotando
do esôfago das criaturas).
ÚTERO E
TIMBRE
Desertos
espaços sem nome ou corpo erravam
Quando ainda
nenhum deus tinha sido criado
Do caos,
reinava o inaudito, a incerteza plena
Absoluto
vazio e abismos puros pairavam
(império
insolúvel, elétrons dissociando-se
Em violenta
catálise
Íons sem
ventre, cátions utópicos)
Do rosto
do nada, ao léu do acaso das coisas
Sem
alento, sopro criador de deuses
Não
exalara (nem ao menos cogitara)
Tudo estava
suspenso num vidro cínico
(das
bactérias apenas tênue espasmo
Ouvia-se
do fim da eternidade úmida).
KANT NÃO ESTUPROU A CAMAREIRA – O livro Kant não estuprou a
camareira (Bagaço, 2012), do
escritor, jornalista, advogado, professor, conferencista e tradutor Vital
Corrêa de Araújo, traz ilustrações da artista visual Cyane
Pacheco e é divido nas partes Ímpeto e Tempestade, Candelabro e Pesadelo, Verbo
de Barro, Elegias Recifenses, Pomar do Apocalipse Poema 21 G F Pergunte a
Pound, Elégias Gravataenses (Meditações de Cacto) e Arte Poética. Veja mais aqui.