REJANE SOUZA – A professora universitária potiguar, Rejane Souza, é mestre em Literatura Comparada, doutoranda em Literatura Comparada pela UFRN, atuando como consultora e assessora de projetos educacionais e cursos e palestras para concursos e sore Luis Gonzaga. Ela também é poeta que edita o blog Travessia Humana e escreve a coluna Veredas Literárias no portal Nísia Dgital. Conheça melhor o trabalho da professora Rejane Souza nessa entrevista gentilmente concedida por ela.
Pesquisa & Cia - Rejane, inicialmente, vamos pras perguntas de praxe: como e quando se deu seu encontro com a Literatura?
O contato com o universo da literatura ocorreu, hoje reflito, de forma inconsciente, pois na fase infantil, morava em área rural, e eu era uma das principais ouvintes das histórias contadas pela minha avó paterna e meu pai, exímios contadores de histórias. Assim, a minha formação leitora brotou desse fértil universo.
Pesquisa & Cia - Quais as influências da infância e adolescência que determinaram sua formação profissional?
Conforme, relato anterior, sem dúvida, minha avó e meu pai foram minhas principais influências. Na região onde passei minha infância – interior de Nísia Floresta/RN - não havia energia elétrica, fato que contribuía para alimentar a minha imaginação diante do vasto repertório das histórias que ouvia. Diante disso, sempre transcendia ao mundo mágico das histórias. Aos 11 anos de idade, quando fui morar na capital do RN – Natal – passei a frequentar a biblioteca pública do Estado, que ficava atrás do colégio em que estudava. E nesse período, a leitura era constante. Aos 13 anos, li os clássicos da Literatura Brasileira, como Dom Casmurro, Iracema. É importante salientar que tais leituras foram realizadas espontaneamente. Outra influência marcante para que pudesse tomar a decisão em optar pelo curso de Letras foram as aulas de Literatura de meu professor do último ano do Ensino Médio, chamado Vieira. Ele levava a gente a viajar pelas escolas literárias e saborear as curiosidades dos escritores. As suas aulas eram um verdadeiro banquete literário. E isso foi determinante na escolha do curso que fiz na UFRN.
Pesquisa & Cia - Você é Mestre em Literatura Comparada ao defender a dissertação de Mestrado sob o tema “Luis Gonzaga: poesia do canto e canto da poesia”. Inclusive você ministra curso e palestra a respeito. Fala pra gente da importância de Luís Gonzaga e da motivação dos estudos acadêmicos, palestra e curso.
As escolhas que faço sempre têm um elo afetivo e profissional. E propor um projeto sobre a obra poético-musical de Luiz Gonzaga na área de Mestrado em Literatura Comparada, em 2002, foi motivado por duas razões: a paixão pela cultura popular e as faces poéticas do signo sertão, que tem Luiz Gonzaga como grande porta-voz e defensor de suas raízes; a outra motivação foi a de prestar um tributo à memória de meu pai, Valdivino, que já havia partido. O senhor Valdivino era um homem do campo e detinha uma sabedoria popular que lhe era singular. Tive o privilégio de receber dele um grande aprendizado, não só da literatura oral, mas também da cultura e dos fenômenos da natureza. A minha paixão pela poesia, pela cultura e pelo simples da vida vem desse legado familiar. Além disso, pesquisar sobre a vida e obra de Luiz Gonzaga durante dois anos e meio ampliou outros olhares sobre o universo musical e literário que a obra do Rei do Baião proporciona. Isso porque o trabalho com a pesquisa, para mim, é como a água que precisamos para matar a sede. Infelizmente, a minha dissertação ainda não foi publicada em livro, embora tenha sido recomendada pela banca de avaliadores, diante da falta de tempo, pois fiz seleção para Doutorado logo em seguida, todavia pretendo publicar ainda este ano, se Deus quiser. Enquanto isso, busco preencher a lacuna, escrevendo ensaios, ministrando palestras durante eventos científicos e datas comemorativas para divulgar a vasta obra poética e musical de Luiz Gonzaga, que tem uma importância fundamental na divulgação da cultura popular desse país. No entanto, a pesquisa vai mais além: em um dos capítulos de minha pesquisa, faço a analogia do conteúdo e forma das músicas de Luiz Gonzaga, em parceria com Humberto Teixeira e Zé Dantas, com as cantigas de amor e de amigos, da literatura trovadoresca, o que marca a contemporaneidade de seu trabalho artístico.
Pesquisa & Cia - Você é doutoranda em Literatura Comparada pela UFRN. Qual é a proposta temática e dos seus estudos para o doutoramento?
Na verdade, a tese já está praticamente concluída, alguns obstáculos relacionados ao falecimento de minha mãe, há um ano, e questões de orientação provocaram o adiamento da defesa, todavia desejo este ano defender. A temática da tese está fundamentada na obra de Guimarães Rosa: Grande Sertão: Veredas e sua vinculação com a estética barroca. Trata-se de um autor que sempre despertou minha curiosidade mediante a sua forma inusitada de escrever. Por isso, desde meu ingresso à Universidade, motivada pelas pesquisas do orientador, que busco enveredar pelos enigmas da escrita desse escritor mineiro. E como participante, durante o Mestrado e Doutorado, de uma base de pesquisa vinculada aos estudos barrocos, que já rendeu várias publicações em eventos científicos regionais e nacionais, como também em livros, surgiu, durante as leituras do Grande Sertão: Veredas, a possibilidade de analisar a presença do barroco no conteúdo, na forma e na linguagem de uma obra que é um marco no campo da literatura brasileira. A literatura de Guimarães Rosa se coloca para o pesquisador como um eterno mistério, por mais que se busque desvendar suas trilhas, muitas veredas há ainda para atravessar.
Pesquisa & Cia - Você ministra cursos de formação, além de consultoria e assessoria em projetos educacionais, entre outras atividades na área. Fala a respeito dessas atividades e de como você vê a educação de hoje com a vigência da LDB 9394/96.
A área de formação docente é onde me realizo como profissional, de forma concreta, pois de nada adianta absorver tanta teoria se não pudermos colocá-la em prática. E nessa prática provocar a multiplicação dessas ações na sala de aula, tendo em vista uma aprendizagem significativa dos estudantes. Hoje, posso afirmar que conheço a maioria dos Municípios do Rio Grande do Norte, e tal conhecimento só foi possível diante dos cursos de formação docente que ministros em faculdades particulares, na abertura das semanas pedagógicas nos municípios e em outros eventos relacionados à leitura e à escrita. A cada curso, percebo que a mediação de saberes junto aos professores, que atuam na rede pública do Estado, permite um aprendizado recíproco, pois há sempre uma troca enriquecedora diante do que ofereço e recebo. E por isso, acredito que é nas interações sociais que promovemos e nos alimentamos de saberes.
Quanto à vigência da LDB, não há dúvida de que houve certo progresso na forma do acesso à educação pública, porém ainda há lacunas nos currículos, nas metodologias e no compromisso na formação de cidadãos críticos. É certo que a sociedade da informação é uma realidade, todavia o espaço e a estrutura das escolas continuam arcaicos. Há um contrassenso entre o que o mercado de trabalho e a sociedade exigem, no que se referem às competências e habilidades dos estudantes, e o que as escolas públicas oferecem.
Pesquisa & Cia - Qual a sua avaliação da educação pública ofertada no Brasil? E no Rio Grande do Norte?
A educação pública no Brasil vem passando por importantes transformações. Uma delas é a democratização do acesso às camadas populares ao ensino superior. Na base, programas como o Mais Educação e Alfabetização na Idade Certa, (só para ilustrar) podem ter um impacto significativo no processo de aprendizagem e nas questões de natureza social dos estudantes, no entanto o que resulta em objeto de preocupação são as formas como esses projetos e programas do Governo Federal são gerenciados na ponta. O problema, hoje, não é falta de recursos, mas o excesso deles. Penso que deveria haver a formação de uma comissão séria para acompanhar e propor intervenções pedagógicas de tantos programas que chegam às Secretarias de Educação do País. Lógico que há exceções, porém bem pontuais. Em síntese: o elemento da politicagem ainda representa o grande entrave para o desenvolvimento de um Sistema de Educação Pública de qualidade no Brasil.
No que trata a Educação do Rio Grande do Norte, a problemática é a mesma citada anteriormente, o RN tem amargado índices poucos atrativos nas proficiências das ciências matemáticas e nas competências leitoras de seus estudantes. Há uma disposição para reverter esse cenário, no entanto, enquanto o componente político dos envolvidos com a educação sobrepor ao componente técnico, o desejo de querer transformar não será suficiente. Para que se possam obter resultados significativos na educação pública, é preciso que todas as esferas comunguem da mesma filosofia, pois uma andorinha ou duas não fazem verão. E, agora, há um desafio maior: o acesso ao ensino superior através do ENEM. As escolas de Ensino Médio terão, obrigatoriamente, que reverem seus currículos e suas práticas, práticas essas afinadas às competências exigidas pelo exame, se isso não ocorrer, o que parece ser inclusivo se reverterá em grande exclusão.
Pesquisa & Cia --Você edita o blog Veredas Humanas e mantém uma coluna homônima no Nísia Digital, onde você veicula sua atividade literária e pedagógica. Qual a recepção pública desses seus espaços?
Na verdade, criei o blog Veredas Humanas como forma de poder suprir meu desejo nato de escrever e me comunicar através da escrita e outras expressões de linguagem. De início, não pensei que tivesse tantas visualizações. Mas, por atuar na área de formação docente, e anterior a isso, ter sido professora do Ensino Fundamental e Médio na Rede Pública, ex-alunos, amigos, professores além de uma rede intensa de amigos queriam (e querem) sempre saber quais são minhas redes sociais. E, assim, o blog ganhou vida e o mundo (rss), o que despertou o meu compromisso em alimentá-lo com mais frequência em respeito aos leitores. Aprecio a arte e cultura em suas diversas formas e busco oferecer em minhas redes sociais informações qualitativas, o que também contribui para a divulgação da minha profissão na área educacional. A recepção que tenho das postagens é bastante carinhosa, pontuando a questão do valor ao que produzo e publico. Essas sutis felicidades não têm preço!
Retornando de Natal para minha cidade Nísia Floresta, onde fixei residência há cinco anos, recebi vários convites para publicar meus escritos: no site gostodeler.com.br, mural dos escritores, uma coluna: Gastronomia & Cinema, na Revista Deguste – e fiz parceria com o Nísia Digital em outros projetos que desenvolvo na região. Nesse processo, ao renovar o blog, ele criou minha coluna que foi a primeira. E pelo que a gente percebe, o Nísia Digital foi crescendo junto com outros parceiros e colunistas. Fico feliz em poder ter contribuído e assim divulgar meus trabalhos na região.
Pesquisa & Cia - A seu ver a internet tem contribuído para a difusão literária e para o desenvolvimento de atividades pedagógicas?
A minha fala nos cursos de formação tem sido exatamente nesse sentido de que a internet, atualmente, é uma grande ferramenta de marketing profissional, para quem faz uso dela de forma adequada. A minha rede Facebook já conta com 2.613 contatos. A maioria deles me conhece de lugares onde estive seja na área de ensino, na área acadêmica ou de eventos. E por tal rede social várias vezes, fui contatada para realizar trabalhos de natureza profissional. No que trata a literatura é, também, um grande instrumento de divulgação dos nossos trabalhos e de amigos que atuam na mesma área ou afins.
Pesquisa & Cia - Você coordenou a I Feira Literária de Nísia Floresta. Fala para gente a respeito desse evento, das realizações e das perspectivas. Quando ocorrerá a II Feira Literária?
Na verdade, fiz minha inscrição nesse Circuito de Feiras quando estava envolvida na implantação do Museu Nísia Floresta, mas por questões éticas e de filosofia do projeto, que modificou após sua inauguração, resolvi me afastar do projeto, e a feira literária não se realizou de forma plena. Agora, envolvida em um projeto mais sólido, a II Feira irá acontecer em junho em Nísia Floresta da forma que foi pensada de inicio.
Pesquisa & Cia - Quais projetos está na sua perspectiva de realizar?
Bem, dia 12 de outubro de 2012, realizamos um evento em homenagem a nossa ilustre escritora Nísia Floresta. O evento ocorreu na Escola Estadual que recebe o nome da escritora na cidade onde a mesma nasceu. Agora, no mês de março de 2013, pretendemos realizar um sarau literário com escritores locais, envolvendo também os potenciais artísticos de Nísia Floresta nas artes plásticas, artesanato, cordéis e contadores de história. Atualmente, estou coordenado um projeto que foi selecionado via edital do BNB Cultural em 2012: Projeto de Formação de Leitores na área de Literatura Infanto-juvenil de forma Lúdica. O projeto, que é patrocinado pelo BNB, BNDES e Governo Federal, envolve professores e jovens da cidade de Nísia Floresta e visa a oferecer estratégias de fomento à leitura e à escrita dos livros de literatura, a fim de que os docentes possam multiplicar em suas salas de aula, formando, dessa maneira, leitores de forma lúdica e significativa. O desejo é de colocar Nísia Floresta na rota de grandes eventos literários.